De declaração obrigatória (apesar de esta exigência legal ser muitas vezes descurada, a leishmaniose é uma das mais terríveis doenças parasitárias que afetam o cão, constituindo uma grave zoonose, em que o cão funciona como principal reservatório do parasita para o homem, e também para outros cães.
Esta patologia, atualmente, é um importante tema de investigação pelo elevado número de animais afetados nas zonas endérmicas pelo aumento da prevalência e pelo seu comportamento oportunista no homem, afetando preferencialmente indivíduos imunodeprimidos.
O agente etiológico desta patologia é um protozoário, parasita intracelular obrigatório de macrófagos pertencente ao gênero Leishmania. No nosso país, a espécie responsável é a Leishmania infantum. Este parasita provoca a forma visceral da leishmaniose, também denominada de Kala-Azar.
Leishmaniose apresenta uma distribuição geográfica vasta, sendo mais frequente em climas quentes. Em Portugal e em muitos países mediterrânicos, é endérmica Um dos focos geográficos de maior prevalência encontra-se na região de Trás-os-Montes e Alto Douro (Distritos de Vila Real e Bragança, e parte dos distritos de Viseu e Guarda) onde de acordo com a Direção Geral de Saúde, entre 1986 e 1999 ocorreram aproximadamente 50% dos cerca de 300 casos humanos notificados. A Área Metropolitana de Lisboa e Vale do Tejo e os concelhos de Évora e Algarve encontram-se também entre as áreas mais afetadas.
O cão é o principal reservatório deste protozoário, embora outras espécies animais possam servir de hospedeiro (raposa, rato, etc).
Esta doença é transmitida exclusivamente pela picada de um pequeno mosquito pertencente ao gênero Phlebotomus, também conhecido por “mosca da areia”, que ao alimentar-se do sangue do hospedeiro o infecta com o protozoário. Apenas a fêmea do mosquito transmite a doença, sendo mais ativa no crepúsculo, ao fim da tarde. É importante que o caçador compreenda que a leishmaniose não se transmite pelo contacto direto com o animal doente, sua mordedura ou secreções.
O parasita uma vez inoculado pela picada do mosquito dissemina-se pela corrente sanguínea atingindo e afetando diversos órgãos nomeadamente baço, fígado, rins, medula óssea, linfonodos e pele.
A sintomatologia clínica desta patologia é ampla e muito variada dependendo do grau de infestação pelo parasita, estado imunitário do animal, tempo de evolução e órgãos envolvidos. O período de incubação da doença é bastante variável, podendo ir dos três meses a vários anos. São queixas frequentes dos donos as lesões cutâneas, perda de peso progressiva, anorexia e intolerância ao exercício. Outros sinais clínicos frequentes incluem depressão (triste), lesões oculares, epistaxis (hemorragia nasal), aumento dos gânglios linfáticos, claudicação (coxeira), onicogripose (crescimento exagerado das unhas), diarreia e vómitos. Nem todos os casos apresentam este conjunto de sintomas o que dificulta o diagnóstico. As lesões cutâneas são frequentes, não dolorosas e incluem alopécia e seborreia seca a nível das orelhas, zona periocular, extremidades e dorso; dermatites ulcerativas no prepúcio, boca e pontos de pressão e nódulos na pele ou mucosas.
O estabelecimento de um diagnóstico começa por uma anamnese completa: é essencial conhecer o local onde o animal vive, e se trata de uma zona endérmica.
O diagnóstico definitivo é feito por observação direta do parasita, mediante citologia aspirativa da medula óssea e gânglios linfáticos ou biopsia cutânea. As técnicas serológicas são de grande ajuda no diagnóstico desta patologia, no entanto um resultado negativo não exclui a existência de leishmaniose. A aplicação de técnicas de biologia molecular baseadas na demonstração de DNA da Leishmania na medula óssea e outros tecidos é de facto o método mais especifico e sensível, sendo de prever que, pela sua crescente disponibilidade, venha a ser o método mais adequado para o diagnóstico desta patologia.
As análises de sangue e urina são de considerável importância no diagnóstico. A proteinuria, a hiperproteinemia, anemia e urémia constituem dados de grande valor orientativo.
O tratamento da leishmaniose não tem sofrido grande evolução nos últimos anos. Os sais derivados do antimônio antimoniato de n-metil glucamina, constituem a base da terapêutica atual, aos quais é associado o alopurinol pelo seu efeito sinérgico. Dietas específicas para doentes renais são de elevada importância quando existe comprometimento renal. A supressão do tratamento tem por base a normalização do proteinograma. Um controlo pós terapêutico eficaz e regular, simultaneamente clínico e laboratorial, melhora substancialmente o tempo de sobrevivência. Durante a terapia há uma melhoria significativa dos sinais clínicos podendo haver mesmo cura clínica, mas o agente está lá, sendo as recidivas frequentes.